[CRÍTICA] Malcolm & Marie

Malcolm & Marie não é uma obra prima, é apenas um retrato da insatisfação de Sam Levinson junto de um romance prestes a acabar.

Como todo streaming existente, a Netflix produz coisas muito boas, coisas medianas e coisas muitos ruins. Para a nossa felicidade, ‘Malcolm & Marie’ é um grandioso acerto. Nesse longa, podemos acompanhar uma noite de discussões intensas de um casal composto por um cineasta e sua namorada (ex) atriz.

O filme é elegante, sensual e confuso; sendo os dois primeiros adjetivos devido à direção bem conduzida, e à câmera, cuja lente é de 35mm e cuja filmagem nos trouxe uma “coloração” em preto e branco, consequentemente remetendo a assistir a um clássico. Já o último se dá por conta da falta de informação (inicial) sobre os personagens. Nós não sabemos o passado deles, não sabemos o que se passou enquanto “a câmera não estava gravando”, não sabemos o que aconteceu na festa de lançamento do filme e, principalmente, não temos ideia de quem são aquelas duas pessoas. Ou seja, tudo que Marie e Malcolm dizem pode ser desde exageros e mentiras até a mais pura verdade. O roteiro ajuda muito nessa nossa desorientação, não mostrando flashbacks nem backgrounds visuais. É tudo na lábia e na briga, o que faz com que mudemos de lado constantemente (o terror das pessoas que gostam de vilanizar personagens kk). Além de trazer diálogo que desenvolvem e movem os atritos entre os personagens, o filme também trabalha com um grande desabafo de Sam Levinson (diretor e roteirista) mediante a forma que a crítica trata obras de cineastas e o ideal de que estes precisam sempre carregar uma grande mensagem em seus trabalhos.

Por ter sido gravado no meio da quarentena, o filme possui alguns artifícios e ideias que serviram para manter o distanciamento social. Estes estão presentes, por exemplo, nos enquadramentos criativos que mantêm a distância entre o cinegrafista e o ator; na equipe de produção reduzida e até mesmo na localização isolada no campo, evitando, assim, contato com outras pessoas. Felizmente, esses “macetes” também serviram para a visão narrativa e para a influência emocional de quem assiste, já que solidão e distanciamento são as coisas que moveram a história dos personagens.

Falando neles; é possível notar que Marie é uma mulher que se encontra insatisfeita, o que a torna teimosa, implicante, orgulhosa e insistente. Porém, também é possível sentir sua dor, seu amor, seu desprezo e muitas outras coisas. Zendaya – que tem apenas 24 anos e já ganhou um Emmy de melhor atriz, por sua personagem Rue, de ‘Euphoria’ – incorpora tudo isso de forma autêntica e intensa. Sua interpretação é apaixonante, mas também extremamente odiável. Sua química com John David Washington é inegável, realmente parece que os dois estão juntos há tanto tempo, seus monólogos são de tirar o fôlego e várias lágrimas. Ou seja, se seu nome for esquecido nessa temporada de premiações será uma grande injustiça – e desperdício – por parte da academia.

Malcolm, por sua vez, está contente; afinal, ele lançou um filme naquela mesma noite. Quer comemorar, e não brigar, o que faz com que se irrite facilmente, revelando uma personalidade egocêntrica e até mesmo um pouco tóxica. Contudo, ele não é apenas isso; os personagens aqui têm camadas, são humanos. Portanto, há momentos (como o da banheira) nos quais Malcolm demonstra de forma pacífica e civilizada que pode acabar com Marie, mas que também a ama – ama demais mesmo, mas não que isso justifique seus atos anteriores. David Washington arrebenta e, diferentemente do último filme em que esteve presente (‘TENET’, dirigido por Christopher Nolan), ele se expressa, se solta, chora, grita e, principalmente, dá voz aos textos do roteiro com uma verdade hipnotizante e um carisma que conquista (ou enoja) o telespectador.

Em suma, pode ser dito que Malcolm & Marie é um filme para ser sentido, e não entendido. Quando for assistir, se entregue aos personagens, à história, compre os diálogos. Não espere grandes acontecimentos, mas sim grandes atuações.

Avaliação: ★★★★★ (5/5)